O mau humor sempre está em mim. Você sabe.
A
novidade é quando ele está escondido... E até que consegui camuflá-lo bem nos últimos
tempos. Mas tem dias que não dá, talvez por que eu certamente estava prevendo
que o dia seria cinza e chuvoso. Tem coisa pior que dia cinza e chuvoso? Me
lembra o inverno, e eu detesto o inverno. E tenho um motivo a mais para
detestar a chuva: a entrada da minha rua fica um verdadeiro pântano, e eu
praguejo contra caminhoneiros, dono de supermercado, e quem mais ousar passar
por mim enquanto eu estou no meio da rua tentando não sujar meu sapato. Seja
ele qual for.
Fora isso, minha pequena estava
sem ração desde domingo a noite. Ninguém viu – no sábado – que estava acabando
e ontem era feriado. Fiquei com remorso e isso deve ter contribuído para a
elevação das taxas mau-humoristicas
no meu sangue. Ainda que eu tenha chegado atrasada no trabalho, justamente para
passar no supermercado antes e comprar a tal ração. Só que não tinha do pacote
azul, só do amarelo.
Ela prefere o azul, Hans.
Ainda assim, não vejo motivos
reais para o mau humor. Não vejo motivo para eu resmungar perguntando o que
querem que eu faça, se o técnico da impressora não veio e é ele que cuida das
manutenções nas impressoras. Mágica? O pó de pirilim-pim-pim está em falta.
O divertido da situação, Hans, é
que eu sinto remorso pelo mau humor sem motivo. Havia um tempo que não, que ele
podia ser descontado em qualquer um e não passava pela minha consciência que as
pessoas não tinham nada a ver com aquilo. Pelo menos agora passa, viu? E tento
me manter afastada da civizliação – mais ainda – em dias como o de hoje. Só que
dias como o de hoje me fazem pensar em muita coisa – talvez seja o clima. Quem
consegue pensar num futuro bom, em dias cinzas? Eu gosto de cor, você sabe.
Enfim, a amiga da minha irmã
perguntou para ela se eu acho que encontrarei um marido trancada dentro de
casa. Ah, Hans... Eu devo rir da metidice alheia? Por que meu futuro deveria
passar pela mente de uma pessoa qualquer? Será que ela não tem outras coisas
pra se preocupar? Acho estranho, sabe? Sei lá... Eu nunca pensei sobre o futuro
dos outros. Não me interessa. E daí me é estranho pensar que interessa para os
outros. Cada louco com a sua mania.
Mas não. Essa é a resposta: Não
acho que eu vá encontrar o tal marido – que por acaso ela supôs que eu queira
ter – trancada dentro de casa. Pra ser sincera, não acho absolutamente nada
sobre esse assunto. Também me é estranho. Talvez a resposta que a minha irmã
deu a ela sirva bem pra todas as perguntas do tipo: É tipo a Morte, um dia virá.
O único porém, Hans,
É que eu acredito na
vida eterna.
C.G.
C.G.
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